quarta-feira, 27 de novembro de 2019

O SURGIMENTO DE HABITAÇÕES CIVIS NO CEARÁ


Imagem de Quixadá, no final do século XIX ou começo do século XX.
Fotografia obtida das redes sociais.


Até meados da segunda metade do século XIX, foram quatro os personagens que estavam diretamente ligados ao surgimento de habitações civis no Ceará.
Sesmeiros. Beneficiários de terras virgens ou devolutas. A habitação se dava pelo processo formal junto à Coroa portuguesa. Ora se apossavam inicialmente dessas terras antes mesmo do processo de formalização, ora depois da regularização. Nasceram assim muitas e grandes fazendas no interior cearense, depois fragmentadas com a morte do dono, quando os herdeiros as vendiam após a inventariança amigável.

Colonizadores. A habitação se dava pelo processo informal, à revelia do controle governamental, quando se apossavam de terras virgens, onde construíam residências. No princípio, eram homens aventureiros, que seguiam interior a dentro por meio de veredas deixadas pelos índios. Posteriormente, mesmo com o crescimento populacional, se apossavam ou compravam terras não habitadas. A regularização ocorreu a partir de 1850, com a chamada Lei de Terras (601/1850), quando o governo imperial tentou regularizar a situação agrária do país no tocante à posse e propriedade rural.
 
Tangerinos. Eram erroneamente conhecidos por comboieiros ou tropeiros, pois existem diferenças: os tangerinos cuidavam da condução do gado em longos percursos, ao passo que os comboieiros e tropeiros estavam mais afeitos às longas viagens em animais de carga. Como faziam longos percursos, tangerinos, comboieiros e tropeiros tinham paradas certas para descanso. Nessas paradas, surgiam algumas habitações, geralmente em decorrência da oportunidade de fazer algum negócio. Ocasionalmente eles não faziam o percurso completo, seja pelo desgaste da função, seja por motivo de doença, seja para a construção de novo núcleo familiar, quando fincavam rudes moradias em terras virgens. Os comboios no Ceará duraram até o ano 1920. Por sua vez, até o ano 1845 não se usavam jumentos nessas travessias, mas apenas cavalos, éguas e, mais raramente, bois (sobretudo nas estradas maiores, como a Estrada Geral do Jaguaribe).
Foras da lei. A Coroa portuguesa chamou os tais de “vadios e vagabundos”. Eram homens procurados pela polícia, seja pelo cometimento de crimes ainda não julgados, seja por fugas das prisões. Evitavam Vilas e Povoados, especialmente depois de uma Ordem Régia de 1766, por meio da qual foi ordenado que fossem criadas vilas no Ceará, determinando que as pessoas que não tivessem residências fixas passassem a residir nessas vilas. O texto chamava de vadios e de vagabundos os homens que viviam dispersos no território cearense, praticando crimes dos mais variados. O receio de ser facilmente identificados, até porque também periodicamente as Vilas deveriam publicar a relação de seus moradores, levou esses homens a se embrenhar na mata, quando fixavam rudes residências.
No final do século XIX e no começo do século XX, alguns povoados tiveram início a partir da chegada da linha férrea, sobretudo nos arredores das estações ferroviárias. A construção dessas casas se dava, em geral, à revelia do controle do proprietário ou posseiro das terras. A justificativa social para essas construções estava ligada, em geral, à facilidade de locomoção para longas distâncias, somada à oportunidade de algum negócio com transeuntes. Esse fenômeno se assemelhava ao que ocorria com o advento e crescimento das estradas usadas pelos tangerinos, tropeiros e comboieiros, quando muitos homens fixaram residências nas proximidades dessas estradas, com vistas à oportunidade de negócios.

No período colonial, não havia cidades, mas apenas Povoados e Vilas. No Império, Povoados, Distritos, Vilas e Cidades. Na República, Distritos e Cidades.
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terça-feira, 25 de julho de 2017

VOLTAIRE E O PRESBITERIANISMO DO SÉCULO XVII



Em Cartas Filosóficas, o iluminista Voltaire (1694-1778) emite sua opinião acerca do presbiterianismo praticado na Inglaterra durante o século 17, embora o filósofo tenha vivido no século seguinte. Antes de qualquer outra coisa, vale lembrar que Voltaire não era católico nem protestante, e não tinha nenhuma simpatia pelas igrejas, o que pode comprometer de algum modo o valor histórico de suas palavras, pois é uma mera opinião pessoal, com base em seus valores morais.

Voltaire inicia afirmando que o referido segmento protestante "não é outra coisa senão o calvinismo puro tal como havia sido instalado na França e que subsiste em Genebra", revelando que os presbiterianos eram muito zelosos no tocante à moral bíblica.

O filósofo afirma ainda que os líderes presbiterianos recebiam pouco dinheiro de suas igrejas, fato este que, segundo ele, os impedia de viver no mesmo luxo dos bispos católicos. Voltaire vai além: assegura que reside aí o motivo que leva o presbiterianismo a condenar a vida luxuosa, ignorando, assim, o fato de que a Bíblia diz que o amor ao dinheiro é idolatria. 

A propósito, Voltaire sugere que, em matéria de pobreza e riqueza financeira, os presbiterianos estavam para Diógenes assim como os católicos estavam para Platão. Como é sabido, Diógenes (o Cínico) era extremamente pobre, ao passo que Platão, de farta riqueza. Voltaire estava dizendo, portanto, que os líderes presbiterianos eram muito pobres financeiramente, ao passo que os líderes católicos eram muito ricos.

O filósofo iluminista é de parecer, ainda, que os ditos protestantes foram mais deselegantes com o rei Eduardo Carlos II (deposto por um presbiteriano, Oliver Cromwell) do que o mesmo Diógenes havia sido com Alexandre, o Grande. Conforme nos relata a história grega, Diógenes tomava banho de sol quando, inesperadamente, recebeu a visita do temido imperador. Este, que apesar da riqueza e do poder de que dispunha, demonstrava considerável admiração por Diógenes, que, de forma crítica, preferiu viver em um barril, sem os mínimos hábitos de higiene. Quando se aproximou do rebelde Diógenes (que tomava banho de sol), Alexandre se identificou e se mostrou pronto a atender a um pedido daquele, desde que não fosse seu trono. Como resposta, Diógenes pediu que o rei saísse de sua frente, pois havia se colocado entre o "banhista" e o sol, de modo que o lazer estaria comprometido. Segundo Voltaire, depois de deposto, o rei Carlos II foi vítima de grandes humilhações pelos presbiterianos, visto que o rei foi obrigado a assistir a quatro pregações evangélicas todos os dias, além de receber ordens para não jogar.

O francês Voltaire atesta, ainda, que o puritanismo praticado pelos presbiterianos escoceses era superior ainda àquele ensinado pelo antigo romano Catão, que, de praxe, se insurgiu contra o luxo, impondo uma austera disciplina moral na administração pública.

Outro dado curioso retirado de Voltaire é com relação à santificação do domingo na Inglaterra. Para ele, foram os presbiterianos que impuseram tal costume, de sorte que a população ficou proibida de trabalhar e de se divertir. Assim, segundo o mesmo autor, os ingleses ficaram privados do lazer cultural no que diz respeito ao teatro e à ópera (bastante difundida no Renascimento), sem falar que o jogo com cartas foi proibido.

O filósofo afirmou, também, que, embora o anglicanismo e o presbiterianismo fossem as duas denominações protestantes mais abundantes na Inglaterra, as demais eram bem-vindas, de modo que havia comunhão entre as igrejas protestantes, com ligeiras dissidências entre alguns líderes.

Voltaire finaliza dizendo que, se na Inglaterra existisse somente uma denominação protestante, o despotismo seria um fato. Se existissem duas, ambas lutariam entre si até a morte recíproca, mas - termina o autor -, "como há trinta, vivem em paz e felizes". Era apenas a opinião do filósofo.

Curiosidades à parte sobre Voltaire: era inimigo das doutrinas bíblicas, era caloteiro (comprava livros e não pagava), violento fisicamente (certa vez deu uma surra num cobrador pelo fato deste lhe cobrar uma dívida não paga), sem contar que, na ânsia da morte, padeceu de sérios tormentos espirituais e psicológicos.
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sexta-feira, 7 de julho de 2017

DECRETO DO CONCÍLIO DE TRENTO SOBRE AS INDULGÊNCIAS



"Havendo Jesus Cristo concedido à sua Igreja o poder de conceder indulgência, e tendo a Igreja usado desta faculdade que Deus lhe concedeu, desde os tempos mais remotos; ensina e ordena o sacrossanto Concílio que o uso das indulgências, sumamente proveitosa ao povo cristão, e aprovado pela autoridade dos sagrados concílios, deve conservar-se pela Igreja, e fulmina o anátema contra os que, ou afirmam serem elas inúteis, ou neguem que a Igreja tenha poderes para concedê-las.
Não obstante, deseja que se proceda à moderação na sua concessão, segundo o antigo e aprovado costume da Igreja; a fim de que, pela facilidade de concedê-la não decaia a disciplina eclesiástica. E ansiando para que se emendem e corrijam os abusos que se introduziram nelas, motivo que leva os hereges a blasfemarem contra elas; estabelece em geral, pelo presente decreto, que se exterminem de forma absoluta todos os lucros ilícitos que se cobram dos fiéis para que as consigam; pois disto se originaram muitos abusos do povo cristão.
E não podendo proibir-se fácil e individualmente os demais abusos que se originaram da superstição, ignorância, irreverência, ou de outra causa qualquer, pelas muitas corruptelas dos lugares e províncias em que se cometem; manda a todos os bispos que cada um anote estes abusos em sua igreja, e os faça presentes no primeiro concílio provincial, para que, conhecidos e qualificados pelos outros bispos, sejam imediatamente delatados ao sumo pontífice romano, por cuja autoridade e prudência se estabelecerá o que for conveniente para a Igreja Universal; e deste modo se possa repartir a todos os fiéis, piedosa, santa e integralmente o tesouro das indulgências.
(Sessão XXV do Concílio de Trento, 4 de dezembro de 1563)."
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Fonte: História moderna através de textos, págs. 121-122.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

KARL MARX: A ESPIRITUALIDADE DO ATEU E O LADO CAPITALISTA DO MAIS FAMOSO COMUNISTA

 

Imagem da internet

INTRODUÇÃO
Karl Marx (1818-1883) é conhecido por seu ateísmo de inclinação anticristã e por sua ideologia anticapitalista. O que não é tão familiarizado é o seu lado espiritual e seu afã por fortunas financeiras. O presente artigo mostrará, a partir de duas obras literárias (uma brasileira e outra norte-americana), os bastidores da vida desse homem que, graças às redes sociais, tem sido recentemente alvo de debates em todo o país.
O BERÇO RELIGIOSO DE KARL MARX
Nasceu num lar com tradição judia (de ambos os lados), havendo inclusive o registro de rabinos entre seus ancestrais. Seu pai se converteu ao protestantismo em 1816 ou 1817, por mera conveniência profissional: precisava continuar advogando depois da proibição de judeus em tribunais alemães. Segundo Josh McDowell, Marx cresceu num ambiente de reconhecida tolerância religiosa. Enviado para estudar numa escola religiosa, não firmou nenhum compromisso com a religião, pois seus pais, embora judeus e depois protestantes, aparentemente não nutriam o zelo pelo protestantismo, tampouco pelo judaísmo. Aos 19 anos de idade, Marx sofreu um colapso nervoso. Perdeu o pai no ano seguinte e uma década depois já era um comunista militante.
A POBREZA BATE ÀS PORTAS
Casou-se em 1843, resultando sete filhos desse matrimônio. O oitavo filho era bastardo, fruto de um relacionamento com a empregada doméstica, porém nunca o reconheceu oficialmente. A solução foi emprestar a paternidade a seu amigo Engels, que aceitou a encomenda do companheiro de luta.
Os dias de glória financeira ao lado dos pais se foram durante sua vida de casado, especialmente quando passou a residir em Londres com a família. O casal perdeu três filhos por agravamento das condições de moradia, má alimentação e atendimento médico inadequado.
Por diversas vezes Marx teve que se dirigir aos amigos a fim de pedir dinheiro emprestado para pagar as dívidas. Chegou a declarar: “Você sabe que sacrifiquei toda a minha fortuna à luta revolucionária. Eu não lamento isso. Bem ao contrário. Se tivesse que recomeçar minha vida novamente, eu faria o mesmo. Porém, não me casaria”.
O ardente desejo pela produção literária minou de Marx o empenho pelo trabalho braçal, o que fatalmente cooperou com sua extrema pobreza financeira. Em 1853, quando o alemão viveu o auge da miséria, era frequentemente visto com uma só roupa por muitos dias seguidos. Comumente perambulava pelas ruas, embebedando-se com facilidade.
O AMOR DE MARX PELO CAPITAL
Embora Marx lutasse com todo o seu vigor intelectual contra o imperialismo capitalista, ele não deixou de cobiçar uma boa dose de dinheiro fácil. Enquanto um tio de sua esposa agonizava, escreveu a Engels, seu parceiro de luta: “Se o cão morrer, estarei fora de complicações”. Referia-se ao ancião pela alcunha de “cão”, e o “fora de complicações” seria a possibilidade de ficar rico caso pudesse colocar as mãos na fortuna. Engels, o destinatário da referida carta, respondeu a Marx: “Congratulo-me pela doença do estorvador de uma herança, e espero que a catástrofe aconteça logo”. Foi nesses termos que os dois mais famosos comunistas se reportaram à oportunidade de o mais famoso deles ficar rico. Na quinta-feira, 8 de março de 1855, enfim Marx desabafa: “Um acontecimento muito feliz. Ontem soubemos da morte do tio de minha esposa, de 90 anos de idade. Minha esposa receberá cerca de 100 libras; até mais, se o velho cão não deixou parte do dinheiro à mulher que administrava sua casa”.
O mais surpreendente, no entanto, foi o modo como Marx se reportou à herança que receberia de sua própria mãe, em 1863: “Duas horas atrás chegou um telegrama dizendo que minha mãe está morta. O destino precisava levar um membro da família. Eu já estava com o pé no túmulo. Neste caso, sou mais necessário do que a velha senhora. Tenho que ir a Trier por causa da herança”.
Foi assim a relação que Marx fez entre a morte da própria mãe (e a de um tio da esposa) com a possibilidade de se deleitar com as heranças decorrentes das respectivas mortes. Marx se achava com as relações cortadas com a sua mãe, quando esta morreu. Mesmo assim, nenhum aparente sentimento brotou de seu coração, senão o desejo de herdar as posses da mãe. O desejo pelo capital falou mais alto.
O LADO ESPIRITUAL DO ATEU KARL MARX
“Sou ateu, graças a Deus”. Obviamente essa não é uma frase de Marx, porém ela pode ser empregada para explicar a relação entre o comunista citado e sua crença no espiritual. Vamos aos detalhes.
Marx se reportou a Deus não como crente, mas com um forte desejo de vingança. “Desejo me vingar daquele que governa lá em cima”, é o que escreveu num poema de sua autoria, chamado Invocação de alguém em desespero. Foi mais além. Sobre o Deus cristão, escreveu de forma mais contundente ainda: “Assim um deus tirou de mim tudo. Na maldição e suplício do destino. Todos os seus mundos foram-se, sem retorno! Nada me restou a não ser a vingança! Meu desejo é me construir um trono. Seu topo será frio e gigantesco. Sua fortaleza seria o medo sobre-humano. E a negra dor seria seu general”.
Em Marx & Satã, obra literária de Richard Wurmbrand (1909-2001), o pesquisador minucioso da biografia do pai do comunismo declara que havia uma estreita relação entre Marx e o satanismo. Numa peça teatral de autoria deste (ou seja, de Marx), chamado Oulanem, o famoso comunista se utilizou propositadamente de um anagrama para o nome bíblico Emanuel, que significa “Deus conosco”. De acordo com o dicionário prático satanista, esses anagramas são bastante utilizados em rituais de magia negra. No poema O Violinista, também de Marx, este escreveu: “Vapores infernais elevam-se e enchem o cérebro, até que eu enlouqueça e meu coração seja totalmente mudado. Vê esta espada? O príncipe das trevas vendeu-a para mim”.
Comentando o trecho do último poema citado, Richard Wurmbrand afirma: “Estas linhas ganham significado quando se sabe que nos rituais de iniciação superior dos cultos satânicos é vendida ao candidato uma espada encantada que assegura o sucesso. Ele paga por ela, assinando, com sangue tirado dos pulsos, um pacto segundo o qual sua alma pertencerá a Satanás após a morte”.
POUCO ANTES DE MORRER, KARL MARX É FLAGRADO ORANDO COM VELAS ACESAS
Marx foi um forte candidato a ter depressão, o que efetivamente ocorreu depois da morte de sua esposa, em 1881. Perdeu três filhos por desnutrição e por falta de higiene. Duas outras filhas suicidaram-se, cujo destino também fora seguido por um genro. O suicídio de sua filha Laura e de seu genro, o socialista Laforgue, se deu depois que o casal perdeu três de seus filhos (netos de Marx). Tudo concorria para a crença de que a vida de Marx estava emaranhada num poço de maldição.
Pouco antes de morrer, já em profunda depressão, foi flagrado em seu quarto, orando “diante de uma fileira de velas acesas, atando a fronte com uma espécie de fita métrica”, segundo Wurmbrand, que postulava pela crença de que Marx estava praticando algum ritual ligado ao satanismo. Independentemente da confirmação dessa afirmação, o certo é que o ateu Karl Marx dava sinais claros que contradizem o comportamento de um ateu convicto. Indiscutivelmente ele experimentou o mesmo vazio do filósofo Voltaire, que, no leito de sua morte, não somente recorreu à presença de padres católicos, como também expressou em palavras e gestos a dor de morrer com o vazio existencial (espiritual) a que tanto se reportam aqueles que já declararam passar por essa experiência.
Até hoje, a literatura mundial parece negligenciar os últimos dolorosos minutos de vida de Voltaire, Marx e Aristóteles. Há quem afirme que Darwin, que não era ateu, tenha passado por experiência semelhante. Mas essa é outra história.
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TEXTO: Robério Fernandes, autor do blog.
FONTES DE CONSULTA: A Cristofobia no Século XXI, de Daniel Chagas Torres, e Evidências da Fé Cristã, de Josh McDowell.
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