segunda-feira, 21 de março de 2011

TEXTO DO HUMANISTA ERASMO DE ROTTERDAN REVELA A FORMA COMO ERAM TRATADAS ALGUMAS CRIANÇAS NA ANTIGUIDADE E INÍCIO DA IDADE MODERNA

O texto abaixo transcrito foi extraído do livro "Dos Meninos", de Erasmo de Rotterdan (1466 - 1536), humanista e autor da conhecida obra, O elogio da loucura. Em outro momento postamos alguns exemplos trazidos pelo mesmo escritor, um dos quais aborda o caso em que um professor ordenou que seu aluno fosse obrigado a comer "cocô" de ser humano. Vamos ao texto:

"As leis humanas restringem o poder senhoril e permitem aos servos moverem ações de maus-tratos contra os patrões. De onde procede tal desumanidade entre cristãos? No passado, Auxo, certo cavaleiro romano, corrigiu o filho à vara e com tamanho rigor que este veio a falecer.

Aquela barbaridade comoveu o povo a ponto de pais arrastarem o algoz até o Fórum e, ali, crivaram-no de estiletes, sem a mínima consideração pelo seu prestígio de cavaleiro. Foi com muito esforço que Otávio Augusto [imperador] conseguiu libertá-lo daquele aflitivo tormento."

Erasmo prossegue:

"Quantos Auxos não estamos a ver hoje [no início da Idade Moderna, que coincide com o período do Renascimento] ! Indivíduos que lesam a saúde das crianças com a sevícia da chibata, debilitando-as e até matando! Para seviciar, só as correias já não bastam mais. Batem com o cabo e desferem bofetadas e socos contra os pequenos. Agarram, mesmo qualquer objeto ao alcance das mãos e arremetem-no contra eles.

Narram os livros judiciais que certo indivíduo deixou no occipício [parte superior da cabeça] do aprendiz o desenho do formato do tamanco de madeira, fazendo saltar para fora um dos olhos. Ainda bem que a lei puniu-o por tamanha atrocidade."

Erasmo prossegue, mais adiante, com novos relatos. Desta vez aborda a situação dos alunos. Diz ele:

"Os iniciantes, ao ingressarem em escolas públicas, são coagidos a despirem-se da 'beca', termo bárbaro para um costume não menos rebarbativo. O jovem inexperiente é mandado para o estudo das artes liberais, mas, ao invés, a quantos ultrajes deprimentes para a sua dignidade de ente livre vai ser submetido!

Primeiro, empastam-lhe o rosto como para barbear. Para isso usam a urina ou outra loção mais fétida ainda [cocô humano]. O mesmo tipo de líquido é embutido pela boca adentro com a proibição de expelir. Com socos violentos quebram-lhe o brio de adolescente. Depois, fazem-no engolir farta dose de vinagre, de sal ou de qualquer outra substância que lhes der na veneta desvairada.

Por último, os promotores da brincadeira exigem juramento de obediência a todos os seus caprichos. Por fim, levantam-no pelo ar, em posição dorsal e atiram-no qual aríete contra um poste. A brutalidades tão vis, sobrevêm, frequentemente, febres e dores imedicáveis que afetam a espinha. Por último, aquelas brincadeiras descabidas findam em bacanais."

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segunda-feira, 7 de março de 2011

A PRÁTICA DE SE ABANDONAR CRIANÇAS NO VELHO MUNDO E SUA RELAÇÃO COM A MATANÇA DE CRIANÇAS DESCRITA NA BÍBLIA

No antigo Império Romano, era comum a prática de se abandonar crianças recém-nascidas. Dos motivos que justificavam tal prática, alguns estavam associados ao adultério e a manifestações político-religiosas.

Assim, se o pai suspeitasse que o filho não era seu, poderia abandonar a criança em um espaço público. Foi o que aconteceu com uma filha de uma princesa, deixada na porta de um palácio imperial, totalmente nua.

Com relação às manifestações político-religiosas, alguns casos curiosos de abandono de crianças ocorreram durante o Império Romano, no ano 19 d.C. No citado ano faleceu Germânico, pai de Calígula e avô de Nero. Como era um homem reconhecidamente amado pelos romanos, logo que se espalhou a notícia de sua morte, alguns pais deliberadamente rejeitaram suas crianças e as abandonaram em sinal de protesto.

Do mesmo modo, quando Nero assassinou Agripina, sua mãe, um desconhecido abandonou seu filho recém-nascido no Fórum da cidade, juntamente com um cartaz que dizia: "Não te crio com medo de que mates tua mãe".

Outro dado interessante pode ter relação com a matança de crianças descrita na Bíblia, cuja informação pode ser autêntica e não mera lenda. Há informações de que correram boatos na plebe romana dando conta de que nasceria um rei, e, alertado por adivinhos, o Senado havia ordenado que o povo abandonasse todos os filhos nascidos naquele mesmo ano.

Havia casos em que a esposa conseguia dissimular o abandono do filho. Às escondidas do marido, ela confiava o filho a vizinhos ou subordinados, que o criava, muitas vezes com a ajuda financeira da própria mãe e, uma vez adulto, o filho se tornava escravo e em seguida liberto, de modo que se garantia a proximidade e o vínculo maternal.

Há casos, ainda, de pais que abandonavam seus filhos porque simplesmente alegavam não ter condições financeiras de mantê-los, assim como ocorre nos dias atuais.

O destino dos filhos abandonados não lhes reservava grandes sortes, não! Eram praticamente excluídos da sociedade, a menos que uma família tradicional fizesse a adoção, em cuja oportunidade a criança receberia o sobrenome do pai, e passava a desfrutar de muitos privilégios em decorrência da referida adoção.

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